Mostra apresenta o cinema de Marlon Riggs a partir desta quinta
Redação – redacao@negrxs50mais.com.br
Bixaria Negra – O cinema de Marlon Riggs, é a mostra de filmes que começa nesta quinta-feira, dia 16, no Rio de Janeiro e na próxima semana em São Paulo. O evento exibe, pela primeira vez no Brasil, as obras do cineasta, ativista e professor universitário, Marlon Riggs (1957-1994). Ele escreveu e dirigiu filmes que documentam as estratégias de sobrevivência e resistência das comunidades negra e gay nos Estados Unidos dos anos 1980 e 1990. A mostra acontece no IMS Rio e no Galpão Bela Maré, de 16 a 30 de junho. Em São Paulo será no IMS Paulista, entre 22 e 29 de junho.
Serão apresentados oito filmes, que incluem longas, médias e curtas-metragens dirigidos por Riggs, além de um documentário sobre sua vida e obra. Para enfatizar a potência e atualidade da produção do cineasta, a mostra exibirá, em diálogo, nove curtas-metragens brasileiros contemporâneos, realizados por jovens cineastas negres LGBTI+.
A programação inclui debates sobre a obra do diretor, com a presença, entre outros, de Cornelius Moore, parceiro de criação e distribuidor dos filmes de Riggs. Além dos bate-papos, no Galpão Bela Maré, haverá uma performance das artistas Dominick di Calafrio, Preta QueenB Rull e Pantera. No dia 17 haverá a festa Mariwô.
Raça e sexualidade com pesquisa e experimentação de linguagem
Nascido no estado do Texas, no Sul dos EUA, em 1957, Riggs graduou-se em história na Universidade de Harvard. Obteve o título de mestre em jornalismo na Universidade da Califórnia em Berkeley, onde iniciou sua trajetória no audiovisual. Entre 1981 e 1994, escreveu, produziu e dirigiu filmes que abordam questões de raça e sexualidade, marcados tanto por extensa pesquisa, quanto pela experimentação de linguagem. Suas obras foram exibidas em festivais e mostras de cinema com importantes premiações. As exibições nas TVs públicas geraram inúmeros debates na sociedade americana. Riggs morreu em1994, aos 37 anos, em decorrência do HIV/aids.
O curador da mostra, Bruno F. Duarte destaca a importância da obra do cineasta e seu compromisso com o ativismo e a construção coletiva: “Riggs é antes de tudo um gênio. Um homem negro, homossexual, que viveu com HIV e foi um exímio narrador. O cineasta construiu uma filmografia inconfundível, celebrada por equilibrar pesquisas rigorosas e ousada experimentação estética. Sua biografia reúne muitos elementos para uma bela história de exceção extraordinária. Mas foi a busca pela experiência coletiva comum, impulsionada por uma urgência de comunicação com pessoas negras, que moveu seu fazer artístico.”
As origens das imagens racistas na cultura popular dos EUA
Entre os títulos apresentados na mostra, está Línguas desatadas (Tongues Untied), filme mais conhecido de Riggs, lançado em 1989. Nas palavras do próprio cineasta, trata-se de “um documentário que tenta desfazer o legado de silêncio sobre a vida de homens negros gays”. O diretor parte de sua própria experiência para criar um ensaio experimental, no qual estão presentes diversos artistas e linguagens, como a performance, o vogue, a poesia e o rap, entre outras. Vencedor do Prêmio Teddy, no Festival de Berlim em 1990, o filme também foi alvo de censuras e ataques após ser exibido na TV pública nos EUA.
A mostra traz também o primeiro longa-metragem dirigido por Riggs, em 1987. Intitulado Do estereótipo negro (Ethnic Notions), o filme investiga as origens das imagens racistas presentes na cultura popular dos EUA. O tema da representação volta a ser abordado pelo diretor em Ajuste de cor (Color Adjustment), de 1991, também exibido na seleção. O documentário percorre 40 anos de relações raciais nos EUA através da análise de programas de entretenimento exibidos em horário nobre da TV, examinando mitos e estereótipos veiculados pela cultura de massas.
Riggs desafiou conceitos e renovou linguagem
Outro destaque é o filme Preto é… preto não é (Black Is… Black Ain’t), finalizado postumamente em 1995, no qual o cineasta parte da receita de gumbo, um tradicional prato da culinária do sul dos EUA feito por sua avó, para complexificar o debate sobre as diversas experiências da negritude nos planos individual e coletivo. Vencedor do Prêmio dos Realizadores do Festival de Sundance em 1995, o longa intercala entrevistas com intelectuais, como Angela Davis, bell hooks e Cornel West, com performances do coreógrafo Bill T. Jones e do poeta Essex Hemphill. Também serão exibidos quatro curtas-metragens dirigidos pelo cineasta.
A seleção reforça o legado de Riggs e sua importância para o debate contemporâneo, como ressalta o curador: “Em meio a uma tradição secular de produções de artistas, ativistas e intelectuais que celebram as experiências negras na diáspora, aciono em minha pesquisa de mestrado sobre Marlon Riggs e nesta retrospectiva inédita a noção de ‘Bixaria Negra’ como uma pista para compreender a dimensão encantada do trabalho coletivo liderado pelo diretor na produção desse conjunto de imagens. Através de sua filmografia, Riggs desafiou, não apenas os conceitos de raça, masculinidade e sexualidade, mas também se rebelou e dançou diante das noções de linguagem, liberdade e poder. Gesto iniciado muito antes dele e que continua a reverberar muito tempo depois através de pessoas comprometidas no presente com a criação de estratégias de resistência e emancipação referenciadas em tecnologias ancestrais e nas infinitas possibilidades da imaginação radical.”
Filmes exibidos na mostra
Títulos de Marlon Riggs:
- Línguas desatadas (Tongues Untied), Marlon Riggs | EUA | 1989, 55′
- Preto é… preto não é (Black Is… Black Ain’t), Marlon Riggs | EUA | 1995, 86′
- Do estereótipo negro (Ethnic Notions), Marlon Riggs | EUA | 1987, 56′
- Ajuste de cor (Color Adjustment), Marlon Riggs | EUA | 1991, 87’
- O blues de Oakland (Long Train Running: A History of the Oakland Blues), Marlon Riggs | EUA | 1981, 29′
- Hino! (Anthem), Marlon Riggs | EUA | 1991, 8′
- Afirmações (Affirmations), Marlon Riggs | EUA | 1990, 10′
- Non, je ne regrette rien, Marlon Riggs | EUA | 1992, 38′
Outros títulos exibidos em diálogo:
- A paixão de Marlon Riggs, Karen Everett | EUA | 1996, 59´
- Noite das estrelas, Wallace Lino e Paulo Victor Lino | Brasil | 2021, 23’
- Fartura, Yasmin Thayná | Brasil | 2019, 26’
- A luz, Matheusa, Sabine Passareli e Salacione Passareli | Brasil | 2020, 10’
- Tudo o que é apertado rasga, Fábio Rodrigues Filho | Brasil | 2019, 28’
- Pietá, Pink Molotov | Brasil | 2020, 5’
- Afronte, Bruno Victor e Marcus Azevedo | Brasil | 2017, 16’
- Negrum3, Diego Paulino | Brasil | 2018, 22’
- Corpos, afetos e memórias, Flip Couto | Brasil | 2020, 14’
- Línguas selvagens, Elton Panamby | Brasil | 2016, 15’
Sessões especiais
IMS Rio
16/6- quinta
18h – Línguas Desatadas + Noite das Estrelas
Exibição seguida de debate com Cornelius Moore, Bàbá Adailton Moreira e Janaína Oliveira.
Galpão Bela Maré
17/6, sexta
18h – Exibição dos filmes Hino!, Afirmações, Non, je ne regrette rien e Noite das estrelas
Sessão apresentada por Cornelius Moore e os diretores do curta Noite das estrelas, Wallace Lino e Paulo Victor Lino.
19h30min – Performance das artistas Dominick di Calafrio, Pantera e Preta QueenB Rull + festa de abertura
IMS Paulista
22/6, quarta
19h – Línguas Desatadas + Noite das Estrelas
Sessão apresentada por Cornelius Moore e Bruno Duarte.
23/6, quinta
19h – Preto é… preto não é + Fartura
Exibição seguida de debate com Cornelius Moore, ao lado do crítico, pesquisador e curador de cinema Heitor Augusto e da cineasta Yasmin Thayná.
Ingressos
IMS Rio – Rua Marquês de São Vicente, 476 – Gávea, Rio de Janeiro/RJ
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Bilheteria: de terça a domingo, das 12h até o início da última sessão de cinema do dia, na recepção.
A bilheteria vende ingressos apenas para as sessões do dia e no ingresso.com
Galpão Bela Maré – Rua Bitencourt Sampaio, 169 – Maré, Rio de Janeiro/RJ
Entrada gratuita. Sujeita à lotação da sala.
IMS Paulista – Avenida Paulista, 2424 – São Paulo/SP
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Bilheteria: de terça a domingo, das 12h até o início da última sessão de cinema do dia, na Praça, no 5º andar. A bilheteria vende ingressos apenas para as sessões do dia. No ingresso.com, a venda é semanal: toda quarta-feira, às 18h, são liberados ingressos para as sessões que acontecem até a quarta-feira seguinte.
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Imagem destaque: Califórnia Newsreel